terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

TÍTULOS DE CRÉDITO

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ACEITE


3.1 Noções Gerais

O aceite teve seu surgimento na Idade Média. Os banqueiros da época se utilizavam desse mecanismo para garantir o pagamento da letra de câmbio. Eles interpelavam os sacados para saber se eles aceitavam ou não as letras, reconhecendo a obrigação pelo respectivo pagamento. No início, o aceite era dado verbalmente, não necessitando da assinatura do sacado. Entretanto, para uma maior segurança, com o passar dos tempos o aceite passou a ser exigido no título, ou seja, tornou-se necessária a assinatura do sacado na letra de câmbio, assegurando dessa forma seu pagamento, fornecendo uma maior garantia ao seu portador e fazendo com que a letra de câmbio pudesse circular com a garantia de que o sacado havia aposto a sua assinatura nela e se comprometera a pagá-la. Hoje, o propósito do aceite ainda é o mesmo, não se modificou, na medida em que, quando o sacado coloca sua assinatura na letra de câmbio, ele se compromete com a dívida nela imposta, tornando-se seu principal devedor.

3.2 Conceito

O simples saque da letra, sem o aceite, em nada vincula o sacado, pois o fato de ter seu nome lançado no título não significa que ele está automaticamente obrigado ao pagamento, uma vez que o aceite é o ato por meio do qual o sacado passa a participar da relação cambiária, pois, quando o sacado lança sua assinatura no título, passa a fazer parte dessa doação, tornando-se seu principal obrigado. È por meio do lançamento de sua assinatura no título que o sacado concorda com a ordem de pagamento dada pelo sacador em seu nome. Registre-se que o aceite deverá ser aposto no próprio título, desconsiderando-se para os efeitos cambiários declaração de aceite inserida em documento apartado.
Nesses termos, podemos conceituar o aceite como uma declaração cambiária facultativa, eventual e sucessiva, por meio da qual o sacado se compromete ao pagamento da letra de câmbio de forma a tornar-se o principal devedor, em substituição ao sacador e endossantes.
Afirma-se que é facultativa porque o sacado não é obrigado a aceitar o título a ele apresentado, não reconhecendo por conseguinte, a obrigação nele estampada. É eventual porque sua falta não desnatura a letra de câmbio, uma vez que não é requisito necessário para sua existência. Sucessiva porque a assinatura do sacado é lançada no título após a assinatura do sacador, ou mesmo após a do tomador, quando este a endossa para terceiro.

3.3 Apresentação para aceite

A apresentação é o meio pelo qual o portador ou o detentor do título se vale para exibir a letra de câmbio ao sacado, para que este manifeste sua vontade de aceitar ou não a ordem de pagamento que lhe é dada pelo sacador. No caso de ser positivo o aceite os demais coobrigados desvinculam-se da responsabilidade como devedores principais, qualidades que o sacado passa a assumir. No caso de haver recusa, ou seja, se o sacado não aceitar a ordem de pagamento que lhe for apresentada o portador poderá levar o título a protesto e a partir desse momento poderá exigir tanto do sacador como dos endossantes o valor da dívida, cujo vencimento se antecipa.
Note-se que a regra geral é a eventualidade da apresentação da letra de câmbio para aceite, ou seja, a princípio a letra somente será apresentada para aceite caso assim queira o seu portador (“A letra pode ser apresentada, até o seu vencimento, ao aceite do sacado” – LU, art. 21), e nada impede que o portador da letra a apresente ao sacado somente para o seu pagamento. Nesse caso, no entanto, o portador da letra e os demais obrigados (sacador, endossantes e avalista) somente saberão se a letra será paga pelo sacado no seu vencimento, diferentemente da hipótese em que a letra contenha o aceite do sacado, ato pelo qual este declara que reconhece a obrigação cambiária e a ela se vincula. Sendo assim, verifica-se que a letra com aceite tem maiores condições de circulação na medida em que nela se verifica a declaração cambiária advinda do sacado, de que este reconhece a dívida e, provavelmente, irá pagá-la em seu vencimento.
Existem casos, no entanto, em que a apresentação da letra ao aceite é obrigatória. São eles: na hipótese em que o vencimento da letra é “a certo termo da vista”, pois é justamente da data do aceite que se inicia o prazo de seu vencimento (LU, art. 23); quando o sacador estipulou, na própria letra, que ela deva ser apresentada para aceite, fixando ou não prazo para tanto (LU, art. 22). A cláusula de apresentação obrigatória deve ser escrita na própria letra de câmbio, no verso ou anverso do título. Quando colocada no verso do título, a declaração deverá ser assinada pelo sacador a fim de que se saiba que partiu dele essa exigência para que não se pressuponha que tenha sido inserida pelo endossante. Em conformidade com o art. 21 da Lei Uniforme, o sacador poderá fixar prazo para que seja efetuada a apresentação. No caso em que o portador não venha a cumprir tal determinação, perderá ele o direito de cobrar a dívida dos devedores indiretos – sacador e eventuais endossantes e avalistas. O art. 43 da Lei Uniforme, sobre esse assunto, assim determina: “O portador de uma letra pode exercer os seus direitos de ação contra os endossantes, sacador e outros coobrigados: no vencimento; se o pagamento não foi efetuado; mesmo antes do vencimento: 1º) se houver recusa total ou parcial de aceite (...)”. Logo, torna-se necessária a apresentação para aceite ao sacado no prazo estipulado e, em não sendo esse prazo observado, perderá o portador o direito de exigir, antes do vencimento, o valor da dívida , porque não procede o protesto por falta de aceite. O que houve foi falta de observância do prazo determinado. Dessa forma, tornar-se-á exigível, no vencimento, a princípio, em face do sacado.
O sacador pode também estipular que a apresentação ao aceite não poderá ser efetuada antes de determinada data. Todo endossante pode estipular a letra que deve ser apresentada ao aceite, com ou sem fixação de prazo, salvo se ela estiver sido declarada não aceitável pelo sacador.
Conforme estabelecido no art. 23 da Lei Uniforme: “As letras a certo termo de vista devem ser apresentadas ao aceite dentro do prazo de um ano das suas datas. O sacador pode reduzir este prazo ou estipular um prazo maior. Estes prazos podem ser reduzidos pelos endossantes”. Dessa forma, pode se dizer que as letras a certo termo de vista, terão o fluir de seu prazo após a apresentação para aceite ao sacado, respeitando o limite de um ano. Entretanto, esse prazo poderá ser aumentado ou diminuído pelo sacador, muito embora ao endossante reste apenas diminuir este prazo.
A cláusula que proíbe a apresentação da letra, ou seja, aquela que determina ser a letra não aceitável, somente poderá ser aposta pelo sacador e tem a função de evitar que, por falta de aceite, a letra tenha seu vencimento antecipado com relação ao sacador, endossantes e avalistas.
Quando da apresentação da letra, existe a possibilidade de o sacado pedir que seja ela apresentada uma segunda vez (LU, art. 24). Porém, o portador não é obrigado a deixar nas mãos do aceitante a letra apresentada ao aceite. Entretanto, se assim o fizer, e o aceitante não devolver a letra, poderá o portador valer-se do art. 885 do CPC, requerendo a apreensão judicial do título.

3.4 Limitação do aceite

O aceite, que exprime a vontade do sacado em aceitar uma ordem de pagamento que lhe foi dada pelo sacador, pode versar parcialmente sobre o montante exposto na letra, ou seja, quando o sacado aceitar a ordem, pode fazê-lo total ou parcialmente, se considerar que somente parte do montante estampado no título é por ele devido. Quando o sacado fornecer o aceite de forma total, tornar-se-á o principal devedor do montante integral da dívida. Entretanto, quando o aceite for dado de forma parcial, referindo-se à parcela do valor determinado na letra, o sacado ficará, então, obrigado até o montante do seu aceite, responsabilizando-se pelo restante os demais coobrigados (sacador, endossantes e avalistas). Nesse sentido dispõe o art. 26 da Lei Uniforme: “O aceite é puro e simples, mas o sacado pode limitá-lo a uma parte da importância sacada. Qualquer outra modificação introduzida pelo aceite no enunciado da letra equivale a uma recusa de aceite. O aceitante fica, todavia, obrigado nos termos do seu aceite”. Nesse caso, mesmo aceita parcialmente, a letra tem seu vencimento antecipado.

3.5 Cancelamento do aceite

O sacado que apôs seu aceite na letra de câmbio, poderá, a qualquer momento, antes da restituição da letra, proceder ao seu cancelamento. O cancelamento do aceite pode ocorrer quando o sacado simplesmente risca sua assinatura que foi colocada no título. Esse ato representa a sua não mais aceitação para o pagamento da letra, e com isso desobriga-se do pagamento. O art. 29 da Lei Uniforme assim dispõe: “Se o sacado, antes da restituição da letra, riscar o aceite que tiver dado, tal aceite é considerado como recusado. Salvo prova em contrário, a anulação do aceite considera-se feita antes da restituição da letra”.
Entretanto, se tornou seu aceite conhecido ao portador ou a qualquer endossante, para com estes ainda resta responsável. Significa isso dizer que o aceite que por outros meio se fez conhecer não poderá ser revogado, mesmo que não conste do próprio título. Se por outro lado é certo que o aceite somente será considerado quando aposto no próprio título, por outro, quando o aceite que foi dado no título chegou ao conhecimento do portador ou endossante por outros meios ou documentos em separado, mesmo após revogar seu aceite, para com estes aos quais noticiou seu aceite ainda ficará comprometido. Trata-se da exceção ao princípio da literalidade, na medida em que um documento em separado poderá ser fonte da obrigação advinda do aceite.

3.6 Recusa do aceite

Se o aceite é facultativo, nada impede que o sacado, à vista da apresentação da letra, se recuse a aceitá-la deixando de assumir a responsabilidade cambiária. Não se trata da simples falta de aceite, que se dá com a impossibilidade de se dá com a impossibilidade de se encontrar o sacado ou na hipótese em que está ele impedido de proceder ao aceite, como no caso de sua interdição. A recusa refere-se á situação em que o título foi efetivamente apresentado ao sacado e este não o aceita por não considerar válida a ordem de pagamento ou por não ter a intenção de se tornar o principal obrigado pela letra.
A recusa deve ser comprovada pelo protesto, que deverá ser feito nos prazos fixados para a apresentação do título ao aceite (LU, art. 44). À vista do protesto por falta de aceite, vencendo-se antecipadamente a letra, caberá ao portador o direito de ação executiva contra o emitente da letra e os demais obrigados (endossantes e avalistas).